Justiça Federal determina demarcação de terrenos de marinha em Caraguá, Ilhabela e São Sebastião





Dos 261 km de costa dos municípios de Caraguá, São Sebastião e Ilhabela, apenas 5 kms da linha preamar médio foram demarcados e homologados
Acácio Gomes


A Justiça Federal do Litoral Norte concedeu no último dia 9 de maio uma liminar que determina que a União, por meio da Secretaria de Patrimônio da União (SPU), cumpra sua obrigação legal de identificar, cadastrar e demarcar todas as áreas de terrenos de marinha nos municípios de Caraguá, Ilhabela e São Sebastião.
Em seu despacho, o juiz federal Ricardo de Castro Nascimento determina que a União apresente em 90 dias um cronograma de trabalho para regularizar a situação.


“Esse trabalho deverá estar concluído em três anos. Fica estabelecida, desde já, multa de R$ 5 mil por dia de atraso na apresentação do cronograma de trabalho no prazo fixado”, cita no documento.
Segundo o magistrado, o domínio da União sobre os terrenos de marinha e acrescidos é decorrência do próprio texto constitucional e não requer registro no cartório de imóveis, conforme jurisprudência consolidada.


“No entanto, o exercício pleno do direito de propriedade pressupõe a delimitação ou demarcação da coisa objeto da relação de direito real. Em relação aos bens imóveis, o exercício pleno do direito de propriedade requer a sua demarcação, inclusive para que tenha seus limites respeitados por terceiros. Não é lícito o não fazer ou fingir que faz. Configurada a omissão, é lícito o controle jurisdicional”.
Em entrevista ao Imprensa Livre, o juiz Ricardo de Castro Nascimento disse que a identificação dos terrenos de marinha e seus acrescidos passa pela demarcação da linha preamar-média de 1831, ponto de partida para a medição horizontalmente dos 33 metros.


“O avanço da maré não é levado em conta e sim o que determina a carta náutica de 1831. Ninguém aqui no Litoral Norte é proprietário de imóvel na praia. Se essa situação continuar gera confusão e insegurança jurídica, por isso a determinação. Na prática, queremos a demarcação e quem estiver nessa faixa terá de pagar a taxa de ocupação ao Governo Federal”, explicou.


União
O que chama a atenção na defesa ao processo é justamente a manifestação da União, que cita que a atuação da SPU está condicionada à existência de recursos orçamentários e humanos.
O juiz explicou que, conforme relatório apresentado pela própria SPU, dos 261 km de costa dos municípios de Caraguá, São Sebastião e Ilhabela, apenas 5 kms da linha preamar-média foram demarcados e homologados.


“No mesmo relatório, é informado que apenas dois funcionários, sem dedicação exclusiva para a tarefa, estão alocados para a demarcação da linha preamar nos referidos municípios”, cita Ricardo de Castro Nascimento.
Ainda de acordo com o relatório da própria SPU, o corpo técnico envolvido na demarcação apresenta subsídios à Advocacia Geral da União em cerca de 9 mil processos de usucapião por ano.


“No exercício da jurisdição federal do Litoral Norte, não posso fechar os olhos à precária estrutura fundiária da região. A ocupação de imóvel lastreada em título de propriedade devidamente registrado no cartório de registro de imóveis é fato raro na região, onde reina a posse como forma de ocupação”, explica o juiz federal.
De acordo com o magistrado, são pelo menos 600 processos por usucapião no Litoral Norte, alguns deles datados de 1978. “Essa quantidade de processo é o mesmo que dinheiro perdido”.


Mesmo com a decisão, o juiz federal propõe uma solução para essa falta de efetivo dentro da SPU. “Pode-se propor uma licitação para contratação de uma empresa terceirizada, seja pela União, ou até mesmo um convênio com os municípios, afinal são partes interessadas no processo. Há necessidade de um trabalho minucioso, inclusive com geoprocessamento”, avalia.
A União não quis se manifestar sobre a decisão da Justiça Federal, porém deve recorrer da decisão.


A ação
A determinação dada pelo juiz federal Ricardo de Castro Nascimento segue pedido feito pelo Ministério Público Federal de São José dos Campos, que ajuizou ação civil pública no ano passado.
A ação foi proposta pelos procuradores da República Ricardo Baldani Oquendo, Fernando Lacerda Dias e Angelo Augusto Costa e visa a regularização dos imóveis em eventuais terrenos de marinha localizados nos três municípios do Litoral Norte e que hoje estão na jurisdição da Justiça Federal de Caraguatatuba.


No documento, o Ministério Público Federal defendeu que a falta de demarcação definitiva da linha preamar-média causa insegurança jurídica quanto à titularidade dos imóveis no litoral, já que os proprietários não sabem se têm ou não o domínio sobre a área que ocupam e se o imóvel adquirido pode ou não ser registrado em cartório. Por outro lado, pessoas podem estar pagando indevidamente taxas de ocupação à União, e outros deixam de ser cobrados quando deveriam pagar.
No Estado de São Paulo, a delimitação da linha preamar de 1831 está incompleta. Nos municípios que são objeto da ação, há regiões inteiras que não possuem linha preamar demarcada. O Ministério Público Federal acompanha a questão há quase cinco anos, por meio de um inquérito civil público.


Foto: Jorge Mesquita/IL

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