21/1/2012 13:37 Aviso aos navegantes!!!





Faroleiros se ‘isolam’ para dar segurança na navegação

Mara Cirino

Ali, no extremo sudoeste de Ilhabela, dentro da área do Parque Estadual (PEI), está localizada uma estrutura que funciona, literalmente, como uma luz para quem navega pelas águas do Litoral Norte, vindos da região sul. Trata-se do conhecido Farol Ponta do Boi, com suas 22 milhas de alcance, em torno de 40 quilômetros. Para muitos, pode ser apenas uma iluminação, mas é ela a responsável por ‘guiar’ os navegantes.
Só que por trás dessa ‘luz’ existem dois ‘anjos’ que dedicam pelo menos dois meses de suas vidas para garantir que outras não se percam no mar. São oficiais da Marinha do Brasil responsáveis por manter essa estrutura em funcionamento. E assim, no pôr e nascer do sol, eles sobem e descem os mais de 17,5 metros para ligar e desligar os geradores e motores que acendem a lâmpada e fazem a lanterna girar.
Nos primórdios, após a sua construção em 1900 e início de funcionamento, em 1912, essa atividade de guardiões dos navegantes competia a famílias caiçaras, onde o homem se responsabilizava pelos cuidados e ainda tinha ao seu lado os familiares. O cargo também era hereditário, passando de pai para filho.
Mas, desde que a atividade virou uma profissão da Marinha do Brasil, em 1992, a competência cabe a pelo menos dois marinheiros que podem ser voluntários ou escalados. Fundamental mesmo é que tenham conhecimento básico de hidráulica, eletrônica, mecânica e carpintaria, pois a eles competem à manutenção dessa estrutura que desde o nível do mar à sua base ao topo chega a 70 metros de altura.
Para contar um pouco desta história e de seus moradores, a reportagem do Imprensa Livre, à convite da Delegacia da Capitania dos Portos de São Sebastião, foi conhecer o Farol da Ponta do Boi, onde só se chega de helicóptero ou embarcação, mas aí são pelo menos três horas no mar contra a 30 minutos no ar.
A aeronave é considerada primordial para o abastecimento do farol, seja de alimento e outros produtos para os ‘moradores’ a óleo diesel para o funcionamento dos motores. Para isso, é montada uma grande operação onde este material é carregado a cada pouso e decolagem do helicóptero, nos helipontos da Marinha, sendo um da Rua da Praia e outro na área do farol.
Segundo o capitão-tenente Mario Octávio Beltrão de Queiroz, oficial responsável pela manutenção do farol e faroletes existentes no Litoral Norte, são pelo menos de 8 a 15 horas de vôo, uma média de 16 idas e vindas para essa operação. A aeronave vem diretamente de São Pedro da Aldeia (RJ) e tem capacidade para carregar até 300 quilos dentro da cabine ou 750 quilos do lado externo.
É bom ressaltar que ao longo dos 10 primeiros anos do farol eram utilizados pelo menos 10 muares (mula ou burro) para auxiliar no transporte de gêneros alimentícios e de material destinados aos faroleiros e familiares.
A chegada da aeronave também é o aviso de que é hora de mudar os moradores. Por isso, quando a reportagem chegou ao farol, se preparava para o retorno o suboficial Vilson Gonçalves da Silva, 43 anos, e o sargento Wanderlei da Silva Maués, 32 anos.
Num bate papo entre duas viagens do helicóptero, foi possível conhecer um pouco da história desses ‘anjos’ da navegação que superam o confinamento e a ausência da família, pois precisam trabalhar justamente para poder sustentá-la.
O pernambucano Vilson Silva é especialista em náutica e voluntário para trabalhar no farol. Pai de quatro filhos e com a família morando no Rio de Janeiro, ele conta que está acostumado com essa vida. Afinal, hoje é mais fácil manter o contato com o resto do mundo, apesar do distanciamento, porque a estrutura da Marinha oferece internet, telefonia rural e até mesmo TV via satélite. Desta forma, o confinamento também é mais confortável.
“Aqui é bom porque sempre estou em contato, diferente de quando servi em outras localidades onde passava de três a quatro meses sem ter como me comunicar e eles não sabiam se eu estava vivo ou morto”.
Já o sargento Maués é de Belém (PA) e tem um filho de 13 anos. Os momentos que passa com ele, virtualmente falando, são os que ajudam a matar a saudade. “Não tem função melhor em prol da Marinha do que ajudar na segurança da navegação”, destaca ele que é militar há sete anos.
Já perto de se aposentar, o suboficial conta como faz para passar o tempo nos dois meses que precisa ficar ‘isolado’. “Além de manter o farol sempre em funcionamento, cuidamos da manutenção dessa área, dos equipamentos, da casa”. Da dupla, ele também é o escalado para fazer a refeição, afinal, Maués confessa que não domina muito bem o fogão.
Ali também foi montada uma pequena academia de ginástica onde os marinheiros podem praticar atividades físicas para não ficarem fora de forma. Cada dupla que se reveza incrementa cada vez mais com outros equipamentos.
Mas a vida na mata não é fácil não, porém o bom de tudo isso é que os militares são preparados para esse lado mais selvagem, que os digam nossos personagens que recentemente receberam a ‘visita’ de uma cobra, devidamente despachada para o continente.
Além do farol, o complexo conta também com duas residências adaptadas para receber também as famílias dos oficiais. Essa é mais uma forma deles não se sentirem tanto a ausência, mas são poucas as esposas e filhos que costumam ir, até porque muitas trabalham e não têm condições de ficar fora por dois meses. Assim, os avanços tecnológicos ajudam na comunicação e na aproximação com o restante do mundo. 

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