“Talvez em 3 anos, de 900 imóveis com matrícula passemos a ter 5 mil”, diz juiz






Durante palestra sobre “Regularização Fundiária”, juiz comentou que dos aproximadamente 11 mil imóveis do arquipélago, 10.100 serão objeto de ações de usucapião no fórum
Thereza Felipelli


O juiz de Direito titular da Vara Distrital de Ilhabela, Carlos Eduardo Mendes, realizou ontem, na Câmara Municipal, para um plenário lotado e interessado, uma palestra sobre “Regularização Fundiária”.
Funcionários de cartórios, da Prefeitura, vereadores, e a população em geral puderam aprender, na ocasião, um pouco mais sobre esse processo que pretende dar titularidade aos imóveis da região.
No final de 2009, com o intuito de promover a regularização fundiária e urbanística em 15 núcleos em situação irregular no arquipélago, foi iniciada, através de um convênio firmado entre a Prefeitura e o Governo do Estado, a implantação do Programa Cidade Legal em Ilhabela, que já passou pelas fases de levantamento topográfico, diagnóstico e levantamento fotográfico, levantamento socioeconômico, estudos de urbanização e melhorias. A etapa agora é de demarcação urbanística, entrada de documentação no cartório e entrada de documentação do terreno.
“Regularização fundiária é dar matricula pra uma pessoa em um processo que envolve o município e o cartório de registro de imóveis”, explicou o juiz, que informou que a maior parte dos imóveis em Ilhabela não possui matrícula. “A ilha tem cerca de 11 mil imóveis, e somente cerca de 900 com matrícula, ou seja, são 10.100 ações de usucapião pra correr no fórum de Ilhabela”, disse ele, que acrescentou que é possível usucapir qualquer área na ilha, exceto o Parque Estadual e a União.
Na primeira parte da palestra, o juiz explicou sobre procedimentos para a aquisição de uma propriedade, falou sobre contrato de compra e venda, escritura, registro da matrícula no cartório de registro de imóveis. Segundo ele, que também explicou as origens da propriedade privada no Brasil, usucapir significa conseguir uma matricula porque ficou um tempo de posse de um imóvel, no mínimo dois anos. O maior prazo é de 15 anos de posse ininterrupta e só não pode ser feito usucapião de área pública.
“Propriedades anteriores a 1973 não possuem matrícula, apenas transcrições”, comentou o juiz, que ironizou: “Mesmo que a passos de cágado, um dia chegaremos à matrícula”.
Sobre a lei de 2009, do projeto Minha Casa Minha Vida, Mendes explicou que beneficiava apenas imóveis até 200 m2, mas, em 2011, emendas ao projeto fizeram com que passasse a valer para qualquer imóvel.


Demarcação de áreas
“No Tribunal de Justiça o regramento se inicia com o auto de demarcação das áreas públicas pelo município. Se definir local exato dos logradouros públicos, crio quadras e então tenho lotes. Dentro desses lotes o próprio município dá a declaração de legitimação de posse. Depois de cinco anos esse titulo se transforma em matricula”, explicou o juiz de Ilhabela, que acredita que “talvez em três anos, de 900 imóveis com matrícula passemos a ter cinco mil imóveis matriculados”.
O juiz explicou ainda que esse auto de demarcação das áreas públicas pode ser feito de uma forma só ou em etapas. “Não sei como vai ser feito aqui, está sob estudo, podemos marcar nova data pra procuradoria da cidade se pronunciar a respeito”, sugeriu.
A partir daí, em Ilhabela, assim como em locais onde o programa foi implantado de forma correta, vai ser mais fácil comprar e vender imóvel com segurança.


Situação peculiar
Presente à palestra, o oficial do Cartório de Registro de Imóveis de São Sebastião, André Luiz Mendes, que atende também Ilhabela, fez questão de tecer algumas considerações. Ele, que já trabalhou em outros cartórios e assumiu essa função em São Sebastião em 2011, disse ter ficado surpreso com a situação peculiar que encontrou nas duas cidades. “Há uma demanda grande em relação à usucapião, questões de posse, de transmissão precária de posse, contratos de cessão de posse, parcelamentos de contribuinte na prefeitura de forma precária. Hoje a impressão que se tem quando compra uma propriedade é que está recebendo a propriedade, mas a pessoa não tem noção do problema que vai ter lá na frente, que não vai conseguir transmitir para seus herdeiros de forma correta”, comentou o oficial do cartório. “Eu me coloco à disposição de todos que precisarem, para esclarecer dúvidas, ajudar nesse processo de regularização fundiária, pra que as pessoas que tenham propriedades possam ter garantias”, complementou.


Lotes
“O que é escritura pública de cessão de posse? É o jeitinho brasileiro”, ironizou o juiz na segunda parte da palestra. “Não adianta fechar muito e exigir demais a ponto de fazer difícil de executar, ou seja, insolúvel. A lei não prevê como fazer a transmissão de um imóvel que não tem matricula”, continuou.
Segundo Mendes, a escritura é registrada na transcrição da propriedade e esse pedaço vai gerar uma nova matricula. “Para quem tem transcrição com metragem grande possa fazer parcelamento do solo e criar lotes cada um com sua matricula existem restrições legais. Um terreno de mil m2 não pode ser dividido em quatro por exemplo”, disse o juiz, que explicou que quem adquirir um lote tem que observar a legislação do município e não vai poder construir no lote todo. “Daí surgem os loteamentos irregulares e os empreendedores fazem sua divisão a bel prazer, pra não ter que assumir certas despesas, vendem com contrato de gaveta pra fugir da lei, e criam uma situação totalmente irregular inclusive para quem adquiriu o lote”, comentou Mendes.
Ainda segundo o juiz, será necessária uma ação fiscalizadora que pode ser feita pela Ordem dos Advogados do Brasil, vereadores e a população de modo geral, que devem acompanhar eventuais irregularidades no processo de emissão de documentos. “Há a necessidade de participação popular em todo o procedimento”.

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